30 Outubro 2019
O bispo de San Diego, nos EUA, Dom Robert McElroy, disse apoiar a permissão de que as mulheres atuem como diáconas na Igreja Católica, naquele que parece ser o primeiro posicionamento público de um prelado estadunidense desde que o Papa Francisco reabriu a avaliação da história da ordenação diaconal de mulheres em 2016.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 28-10-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em entrevista ao NCR no dia 27 de outubro, McElroy disse esperar que a decisão surpresa do papa, no fim do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, de reconvocar a comissão de estudos do Vaticano sobre as diáconas leve a “uma conclusão de que não é proibido ordenar mulheres ao diaconato”.
Questionado se ele pessoalmente havia desenvolvido uma opinião sobre se as mulheres poderiam ser ordenadas diaconisas, o bispo respondeu: “Eu sou a favor disso”.
“A minha opinião é de que as mulheres deveriam ser convidadas para todos os ministérios ou atividades que temos e que não sejam doutrinalmente impedidos”, disse McElroy.
“Eu conversei com alguns bispos que conheço que são muito cuidadosos sobre essas questões, mas que já pesquisaram sobre isso, e eles acreditam que isso não está impedido”, continuou. “Eu acho que, se não está impedido, seria bom fazê-lo.”
McElroy, um dos três bispos dos EUA que participaram do Sínodo da Amazônia, entre os dias 6 e 27 de outubro, falou em uma entrevista de 40 minutos poucas horas depois que Francisco formalmente concluiu o evento com uma missa na Basílica de São Pedro.
As diaconisas surgiram como um tema-chave durante o Sínodo, depois que muitos dos 185 membros votantes do encontro se pronunciaram publicamente sobre um desejo de reconhecer formalmente os ministérios das mulheres na região amazônica, que abrange nove países.
Logo após os membros do Sínodo aprovarem um documento final que disse que a ideia de ordenar mulheres como diáconas esteve “muito presente” durante as discussões, Francisco anunciou que convocaria sua comissão sobre o assunto de volta ao trabalho e acrescentaria novos membros.
Embora alguns bispos dos EUA tenham apoiado publicamente o trabalho da comissão papal – o cardeal Blase Cupich, de Chicago, emitiu uma nota após a sua instituição formal, em agosto de 2016 –, eles geralmente evitaram expressar opiniões como grupo sobre a possibilidade de as mulheres serem ordenadas no futuro.
Em sua entrevista ao NCR, McElroy também falou sobre uma proposta no documento final do Sínodo de que o papa crie um novo papel ministerial para as mulheres, a fim de reconhecer suas capacidades de liderança, denominado de “mulheres líderes de comunidade”.
O bispo de San Diego disse que a proposta surgiu a partir do desejo de reconhecer as tarefas que as mulheres católicas já assumem na Amazônia. Ele disse que uma religiosa no encontro havia dito aos bispos que ela celebra batismos, testemunha casamentos e preside Liturgias da Palavra.
“Muitos de nós, de fora da região, ficaram chocados”, disse McElroy. “Eu acho que não há muitos lugares nos EUA onde as mulheres estejam fazendo todas essas coisas.”
O prelado disse que a ideia do novo ministério era reconhecer tais mulheres como líderes católicas de pleno direito.
“Isso significa governança na comunidade”, disse o bispo. “Agora, isso não se refere ao sentido jurídico de uma paróquia e do direito canônico, mas significa, para todos os efeitos, que a líder de comunidade católica é instituição naquele lugar, seja qual for o seu nome dela.”
“Isso significa que ela está ‘encarregada’ de uma maneira que o nosso direito canônico não permite em relação a uma mulher em uma paróquia”, disse.
Francisco criou a comissão de estudo sobre as diaconisas após uma solicitação do grupo com sede em Roma que representa as irmãs e freiras católicas do mundo, formalmente conhecida como União Internacional das Superioras Gerais.
O papa entregou o relatório da comissão ao grupo em maio. Embora o relatório não tenha sido divulgado publicamente, Francisco disse que o grupo havia originalmente se dividido sobre o papel que as diáconas desempenhavam nos primeiros séculos da Igreja.
O Sínodo da Amazônia se concentrou em dois conjuntos abrangentes de prioridades: como responder às necessidades pastorais dos católicos na região rural e difícil de atravessar, e as graves ameaças ambientais enfrentadas tanto pela Bacia Amazônica quanto pelos povos que a protegeram e a chamaram de “casa” durante séculos.
McElroy, a quem Francisco nomeou pessoalmente como membro do Sínodo, disse que a sua experiência foi de que o primeiro conjunto de prioridades pareceu ter recebido mais atenção nas discussões do evento.
Ele apontou o exaustivo período de 18 meses de preparação para o Sínodo, que envolveu a realização de quase 300 assembleias locais, nacionais e regionais.
Após esse longo processo, disse McElroy, os bispos estavam prontos para fazer perguntas como: “Que métodos de evangelização funcionarão aqui nesses lugares onde trabalhamos? E como podemos olhar para além dos modos pelos quais sempre fizemos as coisas, para podermos pensar maneiras novas e criativas de tornar o Evangelho vivo para as pessoas a quem servimos e para as próximas gerações?”.
“Essa foi a maior pergunta, na minha opinião”, disse o bispo. “Essa foi a que mais recebeu atenção.”
Uma das recomendações que o Sínodo fez ao papa em seu documento final foi permitir a ordenação sacerdotal de homens casados regionalmente, a fim de resolver a falta de ministros em toda a região.
Os bispos sugeriram que os atuais diáconos permanentes casados possam ser ordenados padres, a fim de “sustentar a vida da comunidade cristã mediante a pregação da Palavra e a celebração dos Sacramentos nas zonas mais remotas da região amazônica”.
Embora McElroy tenha dito que achava que a recomendação do Sínodo sobre a questão havia sido construída de uma forma limitada para tratar de uma emergência pastoral em uma região do mundo, ele reconheceu que os bispos de outras regiões também podem fazer pedidos semelhantes agora.
Referindo o fato de que a Igreja permite o clero casado em alguns ritos orientais ou padres de outras denominações que se tornam católicos, McElroy disse que existem “muitas zonas diferentes na vida da Igreja em que existem padres casados na Igreja Católica”.
“Ao mesmo tempo, cada uma delas é um pequeno universo em alguns aspectos”, disse ele. “Se houvesse outros pequenos universos, não seria surpresa para mim se algumas Conferências pudessem pedir isso, mas essa me parece ser uma necessidade muito urgente e premente.”
McElroy disse que uma questão sobre a qual muitos bispos da Amazônia falaram é a dificuldade de preparar programas de formação para diáconos casados que desejem se tornar padres.
“São pessoas com famílias e empregos”, disse o bispo. “Você não pode simplesmente chamá-los. Quando você está formando seminaristas, você diz: ‘Você vai para lá; você vai fazer estes cursos’. Você não pode fazer isso com essas pessoas. Esse é um grande desafio.”
“Isso não vai transformar de maneira maciça o sacerdócio ou as capacidades eucarísticas da Amazônia”, disse McElroy sobre a recomendação do Sínodo em relação aos padres casados.
O Sínodo da Amazônia foi o primeiro de McElroy. Relembrando as três semanas de discussões, o bispo de San Diego disse ter ficado impressionado com o sentimento de unidade entre os prelados da região sobre o conjunto comum de questões que eles enfrentam.
McElroy mencionou que o estrado da sala do Sínodo no Vaticano era decorado todos os dias com imagens de santos e mártires da América Latina, como o arcebispo salvadorenho Óscar Romero.
“Elas continuavam chegando”, disse o bispo. “Estava claro na mente deles que eles ainda são uma Igreja de mártires.”
“Existe um sentimento real de que na Igreja, não apenas no passado recente, mas também no presente, há pessoas em suas comunidades paroquiais, em suas comunidades de fé que são mortas porque estão defendendo a justiça e o Evangelho”, afirmou.
McElroy disse que vários bispos usaram seus discursos durante as sessões gerais do Sínodo para mencionar pessoas que eles conheciam e que haviam sido martirizadas, o que foi particularmente emocionante para ele.
Embora o Sínodo da Amazônia tenha começado com um dos períodos de preparação mais inclusivos e transparentes já realizados nos 50 anos de história dos Sínodos católicos, as discussões na sala foram a portas fechadas, sem transmissões ao vivo nem mesmo a divulgação dos textos dos discursos dos bispos.
As autoridades vaticanas disseram que o sigilo do processo sinodal foi necessário para assegurar que os 185 membros votantes pudessem falar livremente e realizassem um verdadeiro discernimento sobre as necessidades da Igreja na Amazônia hoje.
McElroy, que, além de seu doutorado em Teologia, tem um doutorado em Ciências Políticas, disse não saber se a discussão do Sínodo “necessariamente” precisava ter sido a portas fechadas. “De todos os modos, existe uma desvantagem nisso”, afirmou.
“Há um grande desejo aqui de que o processo não seja conduzido por grupos externos, canalizando as discussões”, disse. “Se isso é demais, eu não sei.”
Referindo-se à importância do processo de preparação do Sínodo, McElroy disse: “Meu sentimento foi de que as bases já haviam sido lançadas de uma forma muito completa”.
“Havia sentimentos muito fortes sobre todas as principais propostas que surgiram”, disse. “Surgiram algumas coisas criativas e novas (...) mas acho que o processo da base foi bastante decisivo.”
McElroy sugeriu que uma questão que pode ser considerada no futuro é como os Sínodos regionais, como o realizado para a Amazônia, deverão lidar com questões locais que também possam impactar a Igreja universal.
“Qualquer que seja essa realidade, ela precisa ser aprofundada”, afirmou. “Uma das perguntas seria: o que você faz com questões universais que surgem como preocupações locais específicas? Como um Sínodo regional pode tomar decisões com sabedoria e chegar a recomendações que não obstaculizem as outras Igrejas?”
“Essa é uma parte que eu não entendo, como isso vai se encaixar”, disse o bispo. “Não foi um problema tão grande aqui, mas há indícios de que isso pode ocorrer.”
McElroy também disse que gostaria de ver mais discussões sobre as mulheres como membros com pleno direito a voto nos Sínodos futuros.
Embora 33 mulheres tenham participado do Sínodo, elas o fizeram como auditoras e peritas, sem direito a voto no documento final.
“Eu gostaria de ver uma discussão sobre isso”, disse McElroy, observando que o grupo dos membros masculinos das ordens religiosas católicas estava representado no Sínodo com direito a voto, mas o grupo dos membros femininos das ordens religiosas não estava.
“Os superiores gerais masculinos elegem representantes, e me parece que é possível que as superiores das mulheres também façam isso”, disse o bispo.
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Bispo de San Diego, nos EUA, é favorável às diáconas católicas e ao voto feminino no Sínodo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU